VACINA ANTI-HPV – ESTADUAL 2008

 

             Houve um debate proveitoso no Congresso Estadual, sendo a mesa composta pela Dr.ª Isabela Balalai, da Sociedade Brasileira de Imunizações, pelo Dr. Mauro Romero Leal Passos, da SGORJ e por nós, Dr.ª Cláudia Jacyntho, da Associação Brasileira de Genitoscopia.
            Viu-se que muitas dúvidas ainda pairam entre os ginecologistas, inclusive nós, que estudamos o assunto.
            Duas vacinas estão no mercado brasileiro.  A vacina quadrivalente, que induz a formação de anticorpos neutralizantes contra os HPV 6, 11, 16 e 18 e a vacina oncogênica que os induz contra os HPV 16 e 18, com parcial proteção cruzada contra os HPV 31 e 45, segundo artigo publicado na revista Lancet, em 2007.  Por isso essa última foi chamada oncogênica, devido à cobertura para os mais freqüentes HPV implicados na carcinogênese cervical, com essa resposta cruzada para outros dois oncogênicos, segundo eles descreveram, aumentando a abrangência dos vírus associados ao câncer cervical uterino, mas lembrem-se que a resposta para o 31 e o 45 foi parcial e mais estudos são necessários para ver a real diminuição de lesões intra-epiteliais escamosas de alto grau (HG-SIL) devidas a esses HPV.
            Quanto à vacina quadrivalente, vem a vantagem de incluir, além dos oncogênicos mais freqüentes 16 e 18, os HPV 6 e 11, de baixo risco para câncer, porém principais responsáveis pelos condilomas acuminados clássicos anogenitais, pela papilomatose recorrente de laringe juvenil por contaminação no parto transvaginal principalmente e pelos condilomas de Bushcke-Lowenstein, que são condilomas gigantes benignos, porém muito agressivos localmente (invadem estruturas vizinhas) e pouco responsivos à terapêutica habitual, com grande número de recidivas.  Felizmente é uma entidade clínica muito rara e acomete dez homens para cada mulher.  Mas a Dr.ª Isabela Balalai nos fez refletir com sua grande experiência em imunização, quando sabiamente nos retrucou dizendo que todas as pacientes devem usar suas economias para se vacinarem contra HPV, diante de nossa colocação de que as vacinas ainda têm um custo muito elevado para a população que mais as merece, já que as pacientes de alto nível socieconômico e cultural RARAMENTE, E MUITO RARAMENTE, terão câncer de colo uterino, por submeterem-se sistematicamente ao exame de Papanicolaou (PAP) ANUALMENTE, de maneira que o intervalo anual anula o problema dos resultados falso-negativos do PAP, que variam de 5 a 40%, dependendo da coleta adequada, da fixação e da interpretação. Nós  indicamos a vacina, SEM DEIXAR DE LADO o Papanicolaou anual, que é muito barato em nosso país,  mas DEIXAMOS bem claro para as pacientes que não têm acesso às vacinas, que se persistirem com seus preventivos TODOS OS ANOS, terão cobertura de prevenção de câncer de colo uterino em torno de 94/95%, ao passo que se vacinarem-se e fizerem o PAP anual, essa cifra pode chegar a 97/98%, num modelo matemático feito por Schiller. Entretanto, se, equivocadamente, ela se vacina e pára a prevenção habitual, a cobertura individual seria em torno de apenas 65% (na América do Sul a prevalência dos HPV 16 e 18 nos cânceres de colo é nessa faixa, lembrando que faltam mais ESTUDOS NO BRASIL, PAÍS CONTINENTAL).  Portanto VACINA MAIS PREVENÇÃO HABITUAL com PAP, PAP + genotipagem ou PAP + RNAm  E6 / E7 PROCEDE  para quem pode, mas só vacina não procede para ninguém.  Vale lembrar que captura híbrida não deve ser realizada antes dos 30 anos (consenso mundial, Praga, 2006) e vem caindo em desuso por ser “pool” de HPV,  não permitindo saber se um determinado tipo persiste, o que é mais importante, a persistência de um tipo viral ativado (Mônaco, 2007).  Na atualidade, se quiserem diminuir o número de resultados falso-negativos do PAP, que o façam com
a repetição do mesmo ANUALMENTE em laboratórios adequados ou associando a inspeção visual com ácido acético e lugol ou realizando genotipagem para HPV ou estudando a expressão das oncoproteínas E6 e E7 pelo RNAm. Devemos diminuir o uso da captura híbrida, que o mundo já diminuiu e cresce no Brasil. Repetindo, o uso ANUAL do PAP é uma excelente forma de prevenção de câncer cervical, desde que bem colhido e bem interpretado (é o que acontece nos consultórios de todos nós).
            O problema BRASILEIRO está na falta de programa sério para a população atendida pelo sistema público de saúde. São sempre as mesmas mulheres que fazem seu preventivo, portanto só 20% das brasileiras fizeram pelo menos um PAP na vida!!!. O problema não está na 2ª e 3ª realidades brasileiras, medicina de grupo e medicina privada, respectivamente. E a 1ª realidade (medicina pública) NÃO tem acesso às vacinas na atualidade (justo a que mais precisa). Precisa, porque não consegue fazer preventivo (PAP) sistematicamente. Sugiro que estudemos uma forma de alcançá-la, num corte por idade, como a França fez. O Governo fornece a vacina para todas as adolescentes aos 14 anos, até que os custos diminuam e outra estratégia será traçada. Mas não conseguimos pensar em pedir para essa 1ª realidade que vive com salário mínimo, quando muito, que use seu dinheiro para se vacinar contra HPV.
            A Dra. Isabela Balalai, autoridade em vacinação, retrucou sabiamente colocando que VACINA não é apenas para ser prescrita para doenças de alta morbiletalidade, mas também para GANHO DE QUALIDADE DE VIDA, por isso ela defende uma abrangência maior para a vacina da gripe e outras, além da do HPV. O Dr. Mauro Romero defende a vacina quadrivalente por incluir cobertura para condilomas acuminados. Voltamos nós às dúvidas: se vacina tem também como objetivo melhorar qualidade de vida, além de proteger contra doenças de alta morbiletalidade, deveríamos dar cobertura às verrugas, pois as mesmas são deveras mais “diminuidoras” de qualidade de vida que uma gripe. Então como orientarmos em relação a que vacina escolher, para aquelas que vão tomar?
            Pensamos que a oncogênica tem a vantagem da proteção cruzada mais estudada para outros dois HPV oncogênicos e os níveis de anticorpos são mantidos mais altos por mais tempo pelo adjuvante que ela contém. Se pensarmos em câncer, talvez esta seja a mais indicada, mas se pensarmos em qualidade de vida, além da prevenção do câncer, a quadrivalente seria mais indicada, sobretudo em mulheres sem relação estável, já que as verrugas são muito mais contaminantes que as SIL de alto grau (lesões pré-cancerosas).
            Concluímos que as vacinas anti-HPV são eficazes em quase 100% (em viragem sorológica) para a população que nunca teve contato com os vírus contidos nelas (não temos sorologia no mercado), MAS A EFICÁCIA em relação à diminuição de lesões intra-epiteliais de alto grau aproxima-se de 35 a 40% de redução das mesmas na população-alvo vacinada no momento, em nosso país. Estima-se que essas meninas e moças tenham 35 a 40% menos chance de ter uma HG-SIL no futuro, diminuindo as exéreses de partes do colo uterino nas mesmas. Como são vacinas com poucos e leves efeitos colaterais, desde que tenham condições, as meninas podem ser vacinadas sob nossa orientação. Por enquanto, não indicamos a vacinação em homens, nem grávidas, nem em pacientes imunossuprimidos, por falta de estudos completos.
            Acreditamos que os resultados na população entre 30 e 45 anos nos tragam mais luz em relação à diminuição dos verdadeiros precursores do câncer, já que grande parte das HG-SIL (NIC2, NIC3) em adolescentes, segundo Anna Bárbara Moscicki, grande pesquisadora nessa população, regride espontaneamente, não consistindo nas SIL verdadeiramente precursoras do câncer. Atualmente somos muito mais conservadores nesse grupo quando, apesar de citologia de HG-SIL, a colposcopia não nos inquieta, com achados anormais menores uniformes e multifocais. VALE REFLETIR!

Prof.ª Cláudia Jacyntho