Para que o casal possa planejar adequadamente sua prole, é mister a INFORMAÇÃO quanto aos tipos de métodos contraceptivos, com suas vantagens e desvantagens discutidas em conjunto (médico-paciente (s)), além da eficácia e possíveis complicações. Se for possível dispor de equipe multidisciplinar composta de médicos, enfermeiros, psicólogos e assistentes sociais para aumentar a abrangência e educação continuada sobre o tema, certamente atingir-se-ia mais facilmente o objetivo de diminuir gravidezes inoportunas, sobretudo nos extremos da vida, que atualmente trata-se de grande problema de saúde pública, principalmente na adolescência precoce.
É deveras importante a informação contínua, persistente e instigadora, pois a maioria dos pacientes conhecem os métodos, mas de forma superficial, o que gera medos infundados ou falta de credibilidade nos mesmos, culminando com a NÃO-ADESÃO CORRETA, que favorece os abortamentos ilegais, com conseqüências graves e gastos desnecessários, já que grande parte acaba internando como abortamentos incompletos, podendo gerar infecções graves e até a morte por septicemia.
Cabe ao médico indicar e/ou contra-indicar alguns métodos contraceptivos, diante de doenças endócrinas, cardiopatias, doenças auto-imunes, hematológicas e outras. Da mesma forma, a orientação médica é fundamental em fases especiais da vida, como na adolescência, climatério e lactação, nas quais o aconselhamento apresenta diferenças peculiares. Vale ressaltar que a contracepção de emergência deve ser difundida, entretanto ressaltando seu caráter EMERGENCIAL e jamais ser utilizada como método, mas apenas na falha ou falta de um deles (por exemplo, ruptura de condom).
Deve-se incitar o uso sistemático de preservativos, com discussões incansáveis sobre a proteção contra doenças sexualmente transmissíveis. Na adolescência, por exemplo, o método contraceptivo ideal, quando não há contra-indicação para uso de hormônios, é a associação de preservativo com pílula combinada (estrogênio / progestogênio).
Lembrar que a informação e a educação sexual para os adolescentes deve ser previamente à primeira relação sexual, já que apenas cerca de 30% dos jovens estão utilizando algum método anticoncepcional na primeira relação, assim como o período de tempo entre a iniciação sexual e a procura por métodos anticoncepcionais gira em torno de seis meses a um ano, período no qual mais ocorrem as gravidezes inoportunas nessa fase da vida.
A informação sobre os métodos contraceptivos deve, portanto, iniciar cedo e ser sempre relembrada aos adolescentes, motivando, passando segurança e facilitando o acesso à pílula e ao condom, binômio ideal nessa fase. Não há um método 100% eficaz, e o uso correto, isolado ou em conjunto, aliado aos fatores que envolvem o ato sexual, exerce forte influência sobre sua eficácia.
Todos os métodos têm suas vantagens e desvantagens, além de efeitos colaterais. Cabe aos pacientes e ao sistema de saúde terem conhecimento dos métodos contraceptivos disponíveis e, com orientação médica, escolherem o método mais adequado ao seu perfil e ao seu momento.
A boa ética do médico implica em informar detalhes sobre indicação, riscos, segurança, falhas e possibilidade de reversibilidade dos métodos contraceptivos para que o paciente escolha o que mais lhe aprouver, de acordo com seus princípios e desejos. Vale salientar que a reversibilidade da laqueadura tubária (LT) e da vasectomia é possível, mas não é provável. Deve-se dar ênfase a esse fato, pois são métodos ditos definitivos, exatamente pela grande dificuldade e pouco êxito na reversão.
HÁ GRANDE ÍNDICE DE ARREPENDIMENTO QUANDO REALIZA-SE LT E VASECTOMIA SEM O DEVIDO ESCLARECIMENTO.
Quanto mais o paciente sabe sobre os métodos, mais livres e coerentes são as decisões. As decisões dos pacientes devem sempre ser respeitadas pelo médico, porém este aconselha e orienta os casais ou os pacientes individualmente, lembrando e frisando que a orientação masculina quanto à paternidade responsável precisa ser mais difundida.
As ações de saúde visam mais as mulheres, esquecendo-se da educação e orientação masculina, desde a adolescência, persistindo na idade adulta, não somente em relação à vasectomia, mas quanto ao uso do condom sistemático em relações extraconjugais, para proteção da parceira estável quanto às doenças sexualmente transmissíveis e para a manutenção da paternidade responsável. O mesmo se aplica aos meninos na adolescência, que necessitam de mais motivação e conhecimento para aderirem ao condom.
Para optarem pela vasectomia ou pela laqueadura tubária, os pacientes precisam estar seguros do que querem, terem união estável, idade acima de 25 anos, com mais de dois filhos e, junto do aconselhamento e orientação médica, cursos ou encontros com equipe multidisciplinar, esgotando o tema, para diminuir o número de arrependimentos. Se a LT for concomitante à operação cesariana, aquela deve ser discutida pelo menos dois meses antes, pois a grávida é frágil emocionalmente e pode decidir pela LT com mais emoção que razão, culminando em maiores índices de arrependimento. Deve-se ler cuidadosamente a lei em vigor, POIS É PROIBIDO INDICAR CESARIANA PARA FINS DE LT.
Maiores detalhes devem ser lidos ou pesquisados no site da FEBRASGO e outros oficiais, antes de aconselhar esterilização definitiva (pouca probabilidade de reversão). Quanto mais jovens, maior a chance de arrependimento posterior e tendência a culpar o médico pela falta de informação. O termo de consentimento livre e esclarecido deve ser preenchido e assinado. Deve-se ESGOTAR o tema em relação a outros métodos reversíveis como os hormonais (orais, injetáveis, adesivos cutâneos, anéis vaginais, implantes, DIU de progesterona) e os DIU de cobre, desde que não haja contra-indicações. Da mesma maneira, deve-se citar a existência dos métodos comportamentais (tabela, temperatura basal, muco cervical, coito interrompido), que requerem muita motivação e persistência, com altos índices de falha. Já os métodos de barreira (são os mais antigos), principalmente as camisinhas feminina e masculina têm a vantagem de prevenir doenças sexualmente transmissíveis (DST), mas a eficácia-uso é pequena pela falta de adesão, principalmente nos casais estáveis. Podem causar alergia ou romperem (se romper, vale lembrar às pacientes que existe a pílula do dia seguinte, aprovada pelo Ministério da Saúde). Os condons são distribuídos em postos do SUS, assim como as pílulas do dia seguinte, que consistem em contracepção de emergência apenas. Ainda nos métodos de barreira temos as esponjas (importadas), os diafragmas (eficácia-uso baixa pelo inconveniente de colocar antes do ato sexual), que serviria para pacientes muito disciplinadas que tenham contra-indicação para o uso das pílulas hormonais e os DIU. Geralmente pacientes com doenças crônicas que contra-indicam o uso de hormônios aderem bem ao uso do diafragma associado a um espermaticida (nonoxinol-9 é o mais usado no Brasil), elevando a eficácia-uso para a real eficácia-método, com índice pequeno de falha. A maior motivação para uso de métodos de barreira é a conscientização quanto à prevenção de DST, ou em pacientes com doenças endocrinometabólicas e em período de amamentação (no qual se pode optar pelo uso de pílulas de progestogênios). Deve-se levar em conta a possibilidade de ASSOCIAÇÃO de métodos de barreiras, para aumentar a eficácia.
Quanto aos métodos hormonais (pílulas orais combinadas de estrogênios e progestogênios, pílulas orais de progestogênios, adesivos cutâneos, implantes transdérmicos, injetáveis mensais ou trimestrais), SÃO OS MAIS EFICAZES quando utilizados corretamente e devidamente respeitadas as CONTRA- INDICAÇÕES. Atualmente as pílulas combinadas contêm pouca quantidade de hormônios, com muito menos efeitos colaterais, ganhando GRANDE ADESÃO das pacientes. Quando são orientadas adequadamente pelos médicos os riscos são muito menores que os benefícios, e atualmente, diante da baixíssima dosagem de hormônios, têm indicação bem mais alargada, mesmo em relação à idade das mulheres, que devem ser controladas na ginecologia quando em uso de hormônios. O índice de fracasso das pílulas combinadas é menor que uma em cem mulheres por ano, chegando perto da LT, que é em torno de 0,3 em cem mulheres por ano, ao contrário do que muitos pensam serem métodos 100% eficazes, apesar de chegarem muito perto. Os hormônios não são inócuos, e, diante de sinais e sintomas como cefaléia, enxaqueca, diplopia, turvação visual, etc.., o médico deve ser contactado. Os médicos individualizam os tipos de pílulas de acordo com o perfil das pacientes, alterando as doses e os tipos de progestogênios, assim como a via de administração, conseguindo adequar pílula-paciente na maioria dos casos, nos quais JÁ FORAM EXCLUÍDAS AS CONTRA-INDICAÇÕES FORMAIS como doenças trombo-embólicas, suspeita de neoplasias hormônio-dependentes, doença coronariana, cerebrovascular ou ocular, diabete grave, hipertensão arterial grave, hepatopatia, lupus, etc.. Os efeitos metabólicos e as interações medicamentosas devem ser lembradas e controladas. Por exemplo, pode-se associar condom às pílulas em pacientes que usam certos anticonvulsivantes que diminuem a eficácia das mesmas.
A grande vantagem é a reversibilidade do método, assim que deseja gestar, além de outros tais quais a melhora da TPM, dismenorréia, diminuição de gravidezes ectópicas, de doença inflamatória pélvica, etc.
Com as pílulas de última geração pode-se diminuir o número de LT , sobretudo em pacientes jovens e hígidas, que concorrem sobremaneira para o alto índice de arrependimento. Os casos devem ser individualizados nesse país de tantas realidades. A CONTRACEPÇÃO É UMA RESPONSABILIDADE TANTO PESSOAL QUANTO SOCIAL (Speroff). A escolha do método também depende do nível socieconômico e cultural. Aquelas que usam pílula devem usar conforme orientação médica e manter o controle indicado, assim como as usuárias de DIU devem estar atentas aos sintomas de infecção genital e procurar o médico diante deles, assim como o também indicado controle. Mas vale ressaltar que a esterilização definitiva requer internação e anestesia geral, com os riscos inerentes à uma intervenção cirúrgica, mesmo que de pequeno porte. POR ISSO DEVE-SE DISCUTIR TODOS OS RISCOS, BENEFÍCIOS E EFICÁCIA, além de possíveis complicações, para que a escolha da paciente seja consciente.
Em relação à contracepção hormonal, vale ressaltar que a pílula do dia seguinte é emergencial e NUNCA um método de escolha.
Outro método bastante utilizado, com vantagem de reversibilidade e desvantagem de facilitar evolução de infecções é o dispositivo intra-uterino (DIU), com cobre ou com progestogênio. Respeitando as contra-indicações (gravidez, infecção pós- parto ou pós-aborto, doença inflamatória pélvica atual ou recente, cervicite aguda, sangramento genital sem diagnóstico, câncer genital, etc..) trata-se de método eficaz (índice de fracasso menor que 5 em 100 mulheres por ano, necessitando de treinamento profissional, lembrando das complicações de inserção do DIU, que devem ser antecipadas às pacientes (dor, reação vagal, sangramento, laceração do colo, perfuração , bacteremia transitória-risco de endocardite em pacientes com doença valvular cardíaca) e das intercorrências (expulsão , dor pélvica e dismemorréia, sangramento anormal, infecção, gravidez tópica e ectópica). Tem a vantagem de ser procedimento ambulatorial, mas deve-se sempre ANTECIPAR , sem terrorismo, a possibilidade das complicações e intercorrências supracitadas, antes da escolha da paciente, que costuma culpar o médico pela omissão desses itens. Atualmente há o DIU de progestogênio, que geralmente leva à amenorréia, por vezes com escapes sanguíneos, tendo o hormônio ação predominantemente endometrial. Individualiza-se os casos e algumas pacientes com endometriose, adenomiose, anemia crônica, etc.., podem se beneficiar com esse método.
Antes de optar por esterilização definitiva (pequena chance de reversão ), esses outros métodos supracitados devem ser expostos aos pacientes, de forma exaustiva, respondendo às dúvidas dos mesmos, colocando as vantagens e desvantagens de cada um deles, assim como sua eficácia aproximada (esclarecer a eficácia-uso e eficácia-método), bem como os RISCOS E BENEFÍCIOS que apresentam os métodos, deixando claro que nenhum deles é 100% eficaz. Deve-se antecipar possíveis complicações e INDIVIDUALIZAR os riscos e benefícios, de acordo com a idade, com doenças de base, com estilo de vida e aceitabilidade para posterior adesão adequada.
Na atualidade, a vasectomia vem sendo mais aceita, porém deve-se seguir os mesmos protocolos que para a LT, lembrando-se que é um método definitivo, apesar da pequena possibilidade de reversão. As contra-indicações existem (infecções e distúrbios de coagulação) e precauções são tomadas nos casos de hérnias inguinais, varicocele, hidrocele, neuroses, disfunção sexual, etc. Requer aconselhamento prévio, pelo menos dois meses antes do procedimento, tal qual para LT, pelo índice de arrependimento e de possíveis distúrbios sexuais por alterações psíquicas, que também podem ocorrer com as mulheres que decidiram pela LT intempestivamente, sem adequada orientação e aconselhamento.
O PLANEJAMENTO FAMILIAR responsável, consciente, orientado e aconselhado por médicos e sua equipe permitiria que a gravidez fosse desejada pelos pais e, com isso, evitaria milhares de internações de mulheres em decorrência de curetagens mal feitas ou uso de medicamentos que levam ao abortamento incompleto, com grande risco de infecção e hemorragia.
O objetivo principal de estimular o crescimento do planejamento familiar consciente e orientado é diminuir o número de abortamentos ilegais que colocam em risco a vida de muitas mulheres. Vale então citar Michel Foucault:
“A VERDADEIRA QUESTÃO É A SOBREVIVÊNCIA DAS CRIANÇAS E NÃO SUA GERAÇÃO, OU SEJA, PRATICA-SE A ANTICONCEPÇÃO, NÃO PARA QUE AS CRIANÇAS NÃO NASÇAM, MAS PARA QUE AS CRIANÇAS QUE NASCEREM POSSAM VIVER, UMA VEZ NASCIDAS”
Prof.ª Dr.ª Cláudia Jacyntho
- Fac. Souza Marques – Rio de Janeiro
- Hosp. Servidores – RJ – MS
- PHD em Ginecologia – UNICAMP
- Mestre em Ginecologia – UFRJ
ANEXO I
INFORMAÇÕES DA LEGISLAÇÃO VIGENTE
I. Seguindo a legislação brasileira, não se deve esquecer que para realizar LT ou vasectomia, por opção voluntária do paciente, este deve ter capacidade civil plena, idade maior que 25 anos ou, pelo menos, dois filhos vivos, além de assinar o registro expresso da manifestação de vontade em documento escrito e firmado (termo de consentimento livre e esclarecido de tudo que abordamos no texto acima).
Deve-se lembrar do prazo mínimo de 2 meses entre a data que manifestou a vontade de LT ou vasectomia e o ato cirúrgico (lei 9.263/1996); do prazo mínimo de 42 dias entre a data do último parto ou aborto e o ato cirúrgico (portaria 48/1999).
Vale ressaltar que também é vetada por nossa lei brasileira a esterilização por ooforectomia e/ou histerectomia.
Por fim, relembrar que a esterilização é ato de notificação compulsória ao SUS, pelo médico executante.
II. A esterilização definitiva (LT) pode ser indicação médica decorrente de RISCO À VIDA ou À SAÚDE da mulher ou do futuro concepto, desde que se satisfaçam, cumulativamente, as seguintes condições: relatório assinado por dois médicos, explicando a situação de risco; termo de consentimento esclarecido escrito e firmado, da paciente e do cônjuge (se houver); prazo mínimo de 42 dias entre a data do último parto ou aborto e o procedimento, salvo se o risco for por cesarianas sucessivas ou se a paciente for portadora de doença de base em que a exposição a segundo ato cirúrgico represente maior risco para sua saúde, sendo assinado por dois médicos (Portaria 48/1999); não configuração de vício da vontade do casal; não haver sido realizada cesariana para fim exclusivo de LT; notificação obrigatória ao SUS pelo médico executante.
III. Em pessoa absolutamente incapaz, mediante autorização judicial regulamentada na forma da lei, jamais por ooforectomia ou histerectomia, com notificação compulsória.
CONCLUINDO, É CRIME deixar o médico de notificar à autoridade sanitária as esterilizações cirúrgicas que realizar; induzir ou instigar dolosamente a prática de esterilização cirúrgica e NÃO SEGUIR A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA, conforme o resumo supracitado. Se houver dúvidas, vale consultar o código penal brasileiro (Lei nº 9.263, 12/01/1996).